terça-feira, 16 de julho de 2013

Clichê celeste

Fotografia de Ana Cecília Romeu - Atlántida, Uruguay

E até eu, que fora destinada 
da palavra divina a ser a assassina, 
calei-me, quase com devoção, 
para poder prolongar esse instante abençoado.
(fragmento de Treze versos, de Anna Akhmatova)



   Seus olhos azuis e o falar doce e explicativo a extasiaram por minutos. Não contou o tempo nem o que aconteceu, porque qualquer palavra para descrever pareceria clichê: comparar seus olhos a um oceano infinito de onde saíam ondas suaves cor lilás, agarrando-lhe dos braços até o ventre.


Ana Prada - Dulzura distante

Na próxima postagem, o segundo episódio das histórias de viagem.

quinta-feira, 4 de julho de 2013

Banho à francesa

Paris, 2002 - fotografias ainda em câmera analógica.

   Histórias de Viagem - episódio 1 -

      Paris, 2002.

   Minha professora de francês já havia me ensinado o verbo “débrouiller”, o famoso “se virar”, ou ainda o mais famoso: “jeitinho brasileiro”. E que em algum momento na França eu teria que dar esse jeitinho, considerando que tinha apenas um semestre de estudo em língua francesa. Isso estava me tirando o sono tanto quanto o medo de subir no avião.
   E não foi, mesmo, que precisei usar o tal jeitinho?
   Finalmente eu e o marido em Paris – Cidade Luz! Uh lá lá! Desde meus nove anos sonhava em conhecê-la, quando a professora de Educação Artística projetou slides da Notre Dame, Museu do Louvre e de muitos dos encantos da capital francesa. Minha decisão de menina: vou conhecer Paris!

Museu do Louvre
   2002 - época em que fomos pela primeira vez, não havia ainda a difusão de sites de reservas de hotéis, que geralmente são confiáveis, onde se procura ofertas adequadas ao bolso, localização e tipo de dormitório pretendido. Tínhamos, então, o endereço de uma pousada recomendada por uma amiga, localizada não muito distante da estação ferroviária, e com disponibilidade de leito.
   Chegando lá, um prédio muito antigo, mas reformado. Fomos até a recepção e tentei arriscar uma das poucas frases que sabia em francês, mas esqueci..., então: “Vous parlez espagnol?” – foi o que me ocorreu, se a moça da recepção falava espanhol, no que me respondeu: “poquito”. E assim “hablamos”.
   Descobrimos que havia duas opções de dormitório: com banheiro apenas com a privada; ou com banheiro apenas com a ducha. Não perguntem por que... Optamos pelo banheiro com a ducha.
   Pelo menos tudo era limpinho e acolhedor, mas na hora do banho... Olhei para a ducha e mais abaixo o botão do registro. Torci para um lado e outro. Mas como se liga isso? Fazia um frio de menos de 10 graus, e eu desafiando meu pobre Q.I. cansado da viagem de trem. Foi quando apertei o tal botão, coloquei a mão para testar antes de entrar: a água quentinha, maravilha! Entrei no box, e a água parou... Como assim, a água parou? – Peeeeeeeeedrrrrrrrooooo, me salva! – gritei ao marido.
   Ficamos os dois tentando entender aquilo tudo, até que ele apertou novamente o tal botão e veio a água, mas percebemos que o botãozinho começava a voltar para frente até que a água parava. E ali estávamos numa nova descoberta: um banho com temporizador que mais parecia uma torneira de shopping center. Mas detalhe: a água escorria por no máximo 30 segundos. What?!
   Então entrou o famoso “jeitinho brasileiro”. Descobri que se ficasse de costas, poderia pressionar o botão com o tronco e obter uma água contínua por muitos minutos. E se ficasse de frente, poderia apertar com uma das mãos o tal botão e passar o sabonete com a outra..., mas uma vez vacilando, logo a água parava.
   E assim, foi meu primeiro banho à francesa: inesquecível e sinistro.

Eis aqui a "prova do crime" - o banho à francesa!
   No final da noite, salmão, queijo brie e vinho Beaujolais.
   Na manhã seguinte, depois de um ‘petit déjeuner’ com mini pão e xicrinha de café frio, fraco e... Para quem está acostumada ao café da manhã gaúcho? Nem pensar, tchê! Solução: novo hotel. Mas isso é outra história...

Café da manhã... e minha insatisfação...


... por sorte, em Paris sempre se dá um jeitinho!

Novas viagens......................................................

   Pessoal, vou intercalar as crônicas de assuntos diversos que publico em jornais do país e já venho postando aqui no blog; com histórias verídicas de viagens, que não tem a pretensão de serem dicas, mas curiosidades bem-humoradas e algumas até assustadoras...
   Senti a necessidade de registrar o que nem sempre os turistas contam, ou o que nem sempre contam aos turistas.
   Relatos ainda em preparo: o fantasma de Veneza; Hallstat - a cidade encantada na região dos Lagos, Áustria; o dia que comprei um bumbum, em Praga, na República Tcheca; abraço brasileiro em Nice, França; Hungria para inglês ver: uma conversa esquisita com o clone de John Lennon; first class, em Heidelberg, Alemanha; a senhorinha do metrô de Paris - visão ou fato?; o choro em Fátima, Portugal; dolce far niente, em Camogli, Itália; flores roubadas ao mestre Wilde, no cemitério Père Lachaise, em Paris; o inusitado arco-íris no Cabo da Roca; a mística de Santiago de Compostela e o que nem sempre se conta sobre o caminho...; brasileiras em Gênova - um almoço inusitado; a Casa da Águia, no Uruguai; o dia da devolução, em Niterói, Rio de Janeiro; Pampas do Rio Grande do Sul e mais sobre a excêntrica capital porteña de Buenos Aires.
   Como o tempo é curto para quem escreve, e também para quem lê, seguirei postando com intervalo maior entre as publicações como já venho fazendo, mas agora intercalando as crônicas com as histórias de viagens.

   E fica aqui o convite para viajarem comigo, o que não significa dizer que vai ser uma coisa necessariamente segura...

"A gente sempre deve sair à rua como quem foge de casa,
Como se estivessem abertos diante de nós todos os caminhos do mundo.
Não importa que os compromissos, as obrigações, estejam ali...
Chegamos de muito longe, de alma aberta e o coração cantando"
- Mário Quintana -
(fotografia- no hotel Laje de Pedra, em Canela - RS, 5 de maio de 2013)