sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Ser humano, eis a questão

   
Fotografia de Pedro Costa


Pensemos nos bichinhos como iguais a nós. Cada ser vivo é uma bênção sobre o mundo 
e deve ser cuidado, seja ele gente, animal, ou vegetal.
(Isabel Rodrigues)


   Uma coisa que sempre me incomodou é o desrespeito com os animais. Jamais entenderei o que motiva o dito ser humano a cometer crimes, seções de torturas e atrocidades, e o abandono de seres tão indefesos. Difícil ser humanista e ao mesmo tempo acreditar no ser humano.
   Retornando a casa, dia muito chuvoso e frio, testemunhei uma cena: um cachorro com dificuldade para caminhar atravessava a rua. Parei o carro, e percebi que uma senhora o esperava do outro lado. Disse-me ela que era um cão que perambulava pela região há dias, e decidiu por adotá-lo e, exatamente no momento em que eu passava, ela o atraia para dentro de sua casa. Ainda assisti aos dois entrando pelo portão: novo lar de um; antigo lar de outro.
   Se existe um prazo de validade para a felicidade de se presenciar uma cena assim, penso que serei feliz por alguns dias.
  



   Gestos como esse nos dão uma espécie de sobrevida de ânimo frente ao ceticismo que por vezes instala-se de forma inevitável, tendo em vista tudo o que se presencia, ou se fica sabendo: crimes contra os animais que são crimes contra nossa própria espécie.
   Pessoas que não valorizam os animais não valorizam outras pessoas. Quem interage em perfeita harmonia e respeito com toda a natureza é mais altruísta e evoluído, consegue distinguir a essência dos sentimentos e das relações, e entregar-se ao código de um idioma reconhecido em todo Universo.
   Ser humano transcende o estar humano, é quando consideramos o outro como uma vida também, em outro corpo e alma. Alguém a quem devemos consideração seja quem for, e muito dessa postura passa pela questão de termos o mesmo respeito pelos outros seres vivos que diariamente nos trazem lições preciosas.
   Quando o gato faz seu assédio felino, nem sempre seu pratinho está vazio, por vezes ele só quer carinho. Quando o cachorro abana o rabo e sorri, porque algo na boca dele modifica e parece um sorriso, nem desconfiem, é sorriso mesmo. Mas quantos seres humanos estão prontos para pedir ou dar carinho e sorrirem uns para os outros?
   Ser humano, eis a questão. Temos de honrar todos os dias o fato de termos nascido com o que se chama de "raciocínio". Que ele sirva então para considerarmos todas as vidas, não somente a nossa, como algo pleno. Afinal, quem não respeita a vida, não merece dela o respeito, simples assim.




*Crônica publicada também nos jornais:
Jornal do Comércio (Porto Alegre)
VS (São Leopoldo)
Diário Popular (Pelotas)
NH (Novo Hamburgo)



**A todos os bichinhos, em especial ao Lito, meu filho-gato. 
Com ele aprendi o "miadês", idioma que me ensinou a ser mais humana.
(02-02-2000/27-08-2013)

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Aviso: 
Neste momento, terei de fazer uma pausa. Visitarei a todos que vierem nesta postagem, e seguirei contato via facebook, embora com menos frequência, onde também continuarei postando meus textos. Até o retorno! Grande abraço!
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sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Às três horas

Fotografia de Pedro Costa
Aos 'desaparecidos' pela ditadura militar.


Lustre escuro
estrelas opacas
regurgitam hélices
líquido
arrebenta e esvazia
coral e ouriços

Ele desapareceu às três horas.

Ninguém mais ouviu suas nuvens
sentiu perfume dos tantos
dos prantos
acariciou suas digitais

Ele desapareceu às três horas.

des...
apare
o
Céu
às três

Pálpebras cerradas
suas digitais
amaciou coral
ouriços
no mar respingou
líquido se fez pó
Desapareceu,
e foi às três horas.

Nadie más ha visto a su cuerpo
sus nubes
sus llantos
Desapareció
a las tres.

Sentiu perfume dos tantos
dos prantos
tocou em estrelas:
lustres-ilustres-escuras.

Às três horas,
desapareceu...


- Ana Cecília Romeu -

quinta-feira, 1 de agosto de 2013

1 grau: Montevideo - New York

Fotografias de Pedro Costa

- Histórias de Viagem - Episódio 2 -

   21 de julho, 2013 - domingo - Cidade de Montevidéu, capital do Uruguai.

   Ainda pela manhã, próximo ao meio-dia e um frio de 1 grau centígrado com sensação térmica de bem menos..., o suficiente para doer os dentes ao sorrir. Nuvens escuras, um vento forte vindo do Mar del Plata (Rio da Prata – que emoldura toda cidade).
   Montevidéu é uma capital peculiar, com um centro de arquitetura clássica em art-deco e art-noveau, convivendo com prédios mais modernos e ecléticos. Apesar de concentrar praticamente a metade da população de todo o país, incluindo a região metropolitana, conserva recantos de cidade do interior, por vezes; e um centro de grande cidade, que bem pode lembrar Nova Iorque, mas... será que não é?






  Caminhando na principal avenida, a 18 de Julio, observei que algumas quadras estavam fechadas ao trânsito. Havia uma grua com luz, fumaça de gelo seco, luz, câmera..., ación? Mas o que é isso?
   Sim, era o que eu pensava, um set de filmagens em plena 18 de Julio. Coisa possível nesta cidade que é grande, comporta o status de capital, mas ainda assim não fica em caos tendo algumas quadras fechadas. Não, se isso for num domingo de 1 grau centígrado.




  

   Soubemos que se tratava das gravações de uma propaganda do café de uma indústria Suíça muito conhecida. Qualquer publicitário adoraria acompanhar essas filmagens, e por acaso, eu estava lá.
   Ainda nos inteiramos que têm sido realizados com certa frequência comerciais de grandes empresas mundiais de diversos segmentos ambientados no centro de Montevidéu. Recentemente, passa um no Brasil de marca famosa de calçados esportivos que foi feito na Plaza Independencia.
   Entrando nas duas quadras fechadas ao trânsito, mas não aos pedestres curiosos, parecia que se estava caminhando mesmo em Nova Iorque. As placas das ruas, dos carros e outras das calçadas foram trocadas por simulações norte-americanas.



   Quietinhos mas nem tanto, observamos: a cena consistia na filmagem do casal protagonista no trânsito movimentado. Ao ouvir o chamado do diretor, os mesmos figurantes atravessavam a avenida, os automóveis davam a partida, o guarda de trânsito fazia os sinais. Tudo do mesmo jeito nas várias tomadas que acompanhamos. E algumas curiosidades: os figurantes usavam roupas de meia-estação, dispensa dizer que não era tarefa fácil naquele frio todo. Além disso, o carro dos protagonistas não pegou num primeiro momento, para riso geral.

Figurantes na pausa das gravações.
Automóvel com os protagonistas.

   
   A sensação foi de estar em Nova Iorque ou qualquer outra grande cidade dos Estados Unidos. O cuidado com os detalhes na produção, por instantes, me fez pensar em ter viajado para um país e chegado em outro. Quase uma viagem dentro de outra. Sensação quebrada pela conversa aqui e ali com os simpáticos figurantes uruguaios. Nesse momento, voltei ao Uruguai, ainda que ali tudo parecesse ter sotaque mais longínquo, tínhamos o vento charrua, o sorriso e a disposição de quem não tem medo do frio. E a certeza: Montevidéu é uma capital tão especial que nela cabe o mundo.


Dedico ao Pedro, meu companheiro de todas viagens.