sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Às três horas

Fotografia de Pedro Costa
Aos 'desaparecidos' pela ditadura militar.


Lustre escuro
estrelas opacas
regurgitam hélices
líquido
arrebenta e esvazia
coral e ouriços

Ele desapareceu às três horas.

Ninguém mais ouviu suas nuvens
sentiu perfume dos tantos
dos prantos
acariciou suas digitais

Ele desapareceu às três horas.

des...
apare
o
Céu
às três

Pálpebras cerradas
suas digitais
amaciou coral
ouriços
no mar respingou
líquido se fez pó
Desapareceu,
e foi às três horas.

Nadie más ha visto a su cuerpo
sus nubes
sus llantos
Desapareció
a las tres.

Sentiu perfume dos tantos
dos prantos
tocou em estrelas:
lustres-ilustres-escuras.

Às três horas,
desapareceu...


- Ana Cecília Romeu -

32 comentários:

  1. Este singelo poema eu escrevi em agosto de 2011.
    A questão da ditadura militar no Brasil e América Latina e os 'desaparecidos' sempre me inquietou muito. Apenas aguardava uma espécie de "clique" que me avisasse que era a hora de postar. Eis aqui.
    Abração a todos!

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  2. Que maravilha e essa questão mexe com todos! Lindo! Adorei!E a foto igualmente maravilhosa! beijos, lindo fds com frrrrio e chuva! chica

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  3. Lindo! Bom, tu sabes, sou completamente analfabeta em poesia... mas essa questão levantada ali é inquietante, realmente. Bela postagem, parabéns!

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  4. Ahhhhhh... gostei muito da mescla de versos em português e espanhol... dá bem o tom latino dos acontecimentos passados!

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  5. Sem perder a ternura da inquietude.
    Parabéns!!!!
    Beijos.

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  6. Olá ANA,

    achei de uma inspiração poética formidável isso que li:

    "Ninguém ouviu mais suas nuvens"

    Excelente!

    Um abração carioca.

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  7. Ah querida flor, bem parece uma canção. Triste, mas real e latente. A fotografia, os versos tão bem combinados, o espanhol: um canto em minha alma.

    Gostei demais, você deveria escrever mais poemas... Diga ao Pedro que estou adorando as fotos dele.
    Um beijão!!!

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  8. Olá!Boa noite
    Cissa
    ... gostei muito, porque entendo que cada mensagem contém uma intenção, e assim, quando se valoriza o texto na sua elaboração, com o uso de combinação de palavras, figuras , exploração dos sentidos e sentimentos...nossa, consegue me emocionar, e mais ainda consegue me transmitir a mensagem e a realidade , ...pouca coisa mudou desde o ano em que vc o fez (2011...para cá).Me lembro ,quando da eleição do novo Governo, que fora pedido uma investigação e esclarecimentos sobre a repressão aos trabalhadores e ao movimento sindical durante a ditadura militar.Infelizmente, todo esse processo de resgate da história da ditadura é muito recente no Brasil, pois a Comissão da Verdade existe só depois 2012 ,no Brasil, e apesar de todas as apurações realizadas ainda tem muita coisa pra ser mostrada e reconhecida.Por isso, muitos ainda esperam que os assassinatos e desaparecimentos ocorridos na época sejam esclarecidos e os responsáveis conhecidos...nesse que foi um passo importante na conquista da democracia e para a virada histórica ao por fim à atuação ditatorial dos militares...
    Obrigado pelo carinho
    Belo final de semana
    Beijos

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  9. Cissa querida,

    Nem vou entrar no mérito da questão, apenas aplaudir o seu fabuloso poema (de singelo ele nada tem). Você está sempre surpreendendo com os seus talentos. Bem oportuna a publicação.

    Foi bem interessante intercalar versos em espanhol. Emocionante a homenagem.

    Adorei! Parabéns!

    Gostei da foto.

    Obrigada pelo carinho.

    Excelente final de semana.

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  10. Oi Cissa!

    Menia, estou gostando muito dessa sua faze poetiza!
    Muito legal e emocionante esse seu poema. Você manja das coisas da escrita viu minha amiga!

    Tenha um lindo final de semana!

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  11. Com que veemência leio poema que apareceu não sei a que horas, mas cá às 3 cabalísticas horas e com lustres apagados leio inspiração pra lá de acesa. Lindo!
    Cadinho RoCo

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  12. Lindo Cissa, e com um tema bem delicado. Sempre fico meio baratinado em comentar poesias, pois nem sempre o jogo de palavras tem o mesmo sentido e interpretação das do autor. Lembro que ficava meio perdido ao comentar as poesias do Jorge Pimenta, tamanha a beleza e fineza literária que ele expressava. Mas teu poema está belíssimo, parabéns Cissa.

    Abração.

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  13. Concordo com o nosso colega Paulo Cheng. Comentar poesia é muito delicado.
    A foto ficou linda.
    Palmas!!!!

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  14. Cissinha, tudo bom por aí?

    Pois, seus versos transmitem - de modo certeiro - toda a angústia por trás do desaparecimento de uma pessoa: onde está? O que foi feito dela? Por que suas nuvens dissiparam e nunca mais apareceram por estes céus? E o sentimento só aumenta quando o "desaparecimento" recebe tais aspas porque sabemos como muitos aconteceram durante o período das ditaduras militares na América Latina principalmente na década de 70.

    E falando nos "desaparecidos", lembro de o depoimento de uma das Mães da Plaza de Mayo, em Buenos Aires - talvez o mais aguerrido e tocante movimento que procura saber o que de fato aconteceu aos "desaparecidos" na terrível e cruel ditadura argentina - em que ela dizia ainda sentir o perfume do filho. E você traz isso no poema: eis a sinestesia dos versos, o que deve ser mais tocante para quem teve um ente querido "desaparecido" naquele período. Ou mesmo em relação às dezenas de pessoas que desaparecem por vários motivos neste país.


    Um beijo pra você!

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  15. Oi Cissa
    Não sabia que vc também era poetisa queridona! Lindo!!! Muito profundo e emocionante! Outro dia vi o filme da Zuzu Angel, cujo filho e ela mesma foram mortos pela ditadura, e fiquei pensando em postar algo sobre o assunto também, ainda não tive a inspiração certa. Adorei o post, assim como adoro suas visitas!
    Bjão. queridona!

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  16. Oi Cissa!
    Tudo bem com você? Caramba, faz um bom tempo que eu não dou as caras por aqui...
    Adorei essa poesia. Não sei por que, mas parece que a ditadura militar está tendo um impacto forte em mim, eu digo no sentido de conhecimento, são coisas que eu não consigo entender simplesmente com alguém me explicando, é algo como... eu tenho que correr atrás e entender com a minha própria perspectiva, até compus uma canção sobre isso... Se não me engano ela se chama "Debaixo do Cata-vento".
    bjs

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  17. Cissa, querida amiga
    Você arrasou. Um misto de dor, saudade, revolta, e indignação quantos não terão sentido?

    Mas, este poema transmite uma sensação de conforto pela sua eloquência refino e leveza nos versos. Magnífico. Amei.
    Uma linda semana.
    Beijos.

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  18. Que lindo, Cissa! Quando se reflete sobre essas ocorrências, sofre-se, mesmo que não se tenha vivenciado uma perda. Uma tristeza que muitos jamais conseguirão tirar do coração. Você foi magnífica. Parabéns!!! Grande beijo!

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  19. ...estrelas opacas...hélices...prantos...pálpebras cerradas... Cissa, há muitos sentimentos nas entrelinhas. Beijos!

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  20. Justa homenagem aos desaparecidos políticos,que não tiveram a chance que temos de ler esse poema.Fico pensando em suas famílias que aguardam notícias sobre essas pessoas que tiveram opinião diferente e foram calados á força.Parabéns

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  21. Querida amiga Císsa!

    Linda poesia e homenagem aos soldados desaparecidos. Eles merecem.
    Parabéns!

    Minha amiga, como está o Lito, o teu Filho-gato?
    O que tem ele?
    Vou orar para ele ficar bom.
    O Freddie, está grande e lindo. Faz 5 meses a semana que vem, já é um adolescente. Continua carinhoso e brincalhão.
    Já caça! ;)

    Beijinhos,

    Cris Henriques

    http://oqueomeucoracaodiz.blogspot.com

    http://jakeemary.blogspot.com

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    Respostas
    1. Cris, querida amiga portuguesa!
      Apenas para esclarecer, os desaparecidos eram civis que foram contra a ditadura militar, por isso, perseguidos e tudo o mais que podes imaginar.
      Sobre o Lito, vou agora no teu espaço.
      Grande beijo para ti e o Freddie!

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    2. Císsa, amiga;

      É sempre o povo quem sofre mais.
      Lamento pelo Lito. Vocês estão no meu coração e nas minhas orações. Amiga, pede a Deus um conselho. Ele dar-te-á uma resposta.

      Beijinhos,

      Cris Henriques

      http://oqueomeucoracaodiz.blogspot.com

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    3. Querida amiga Cris,
      farei isso com certeza.
      Muito obrigada por tudo!
      Grande beijo!

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  22. a palavra fez-se não apenas para dizer, também para ser. o que nos distingue dos demais não é apenas a arte de pensar; é igualmente a coragem de dizer... para ser. e há no mundo tantos relógios que quebram às três horas... e nós não o adivinhamos; sabemo-lo, se não nos acobardarmos num cerrar de olhos. aí, no brasil, aqui em portugal, em cada pedaço do mundo... do nosso mundo, esse mesmo que tem a textura da nossa pele e nos cabe imenso na palma da mão.

    beijinho, querida amiga de tanto talento e voz de coragem!

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  23. Linda homenagem Cissa! Cada palavra um sentimento pela perda, porque ele se foi e não voltou. Essa foi minha interpretação. E a esperança se tornou apenas a lembrança de alguém que não vai voltar. Belo!
    Grande abraço

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  24. Visitando blogs amigos conheci o seu.
    Adorei o poema.

    filhadejose.blogspot.com

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  25. Olá, Ana.
    Grande e emudecedora poesia; os desaparecimentos perpetrados por ditaduras são uma vergonha de nosso passado e, infelizmente, de nosso presente (só que hoje ele ocorre via governo oficial, como no emblemático caso do pedreiro Amarildo) e o que podemos fazer em relação a isso é nunca esquecer e jamais ficarmos calados.
    Abraço, Ana.

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