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Fotografia de Ana Cecília Romeu |
(...) não se esqueça que a felicidade é um sentimento simples,
você pode encontrá-la
e deixá-la ir embora por não perceber sua simplicidade.
Mário Quintana in Felicidade Realista
O ser humano é um eterno insatisfeito. Dessas
insatisfações, por vezes, curiosidades, explorações e (re)começos se
‘descobriu’ as Américas, por exemplo; e conheci dona Vera, vizinha querida com quem
amplio os territórios da amizade.
Recordo-me que a professora de francês me
disse para nunca deixar a vida muito resolvida. (Ne laissez jamais votre vie très parfaite!). Em uma referência ao
pequeno caos como fluxo de longevidade: andar pela contramão, jogar
travesseiros por todos os lados. Mas a iconoclastia tem a fase da reconstrução,
do recomeço, e isso dá trabalho imenso tal qual remontar quebra-cabeças de
milhares de peças: o que mais nos edifica quase sempre não está na nossa linha
de conforto.
Talvez por isso se perceba tantos relacionamentos,
de amor ou de amizade, sendo regidos por decreto: instantâneo do mando-obediência-estabilidade,
do ‘felizes para sempre’ via corretor ortográfico, ou do ‘até que a tecla
delete nos separe’. Já a democracia é trabalhosa, exige diálogo, negociação,
diplomacia, é via de mão dupla.
Há um tempo criei o que chamo de sétima
gaveta. Um espaço imaginário onde coloco as tristezas, frustrações, perdas. E
que fiquem por lá. Para ser forte e tentar ser feliz, é necessário enxergar o
lado bom de tudo, e ele existe. Por vezes, a sétima gaveta abre involuntariamente soltando
todos esses monstros: as pendências, as ausências, a pessoa que tirou a vírgula
do “não, te amo”. E não nos resta muito
mais do que tentar desmitificar essas criaturas, as tornando mais parecidas com
o brincalhão e pouco assustador Fantasma de Canterville, de Oscar Wilde.
Optar pela luz não é
ignorar a existência das sombras, até porque uma não sobrevive sem a outra, mas
é tentar recompor-se para recomeçar, avançar; pois a felicidade, mais do que um
processo, é uma opção.
A tristeza é valorizada como forma de auto descobrimento,
pré-requisito evolutivo. Não se enfatiza os momentos de felicidade como parte desse crescimento. Existe
a ditadura escamoteada do sofrimento. A tristeza como imagem de profundidade,
como se o contrário fosse bobo e superficial.
Que bom seria que
nunca nos esquecêssemos dos instantâneos mais felizes e das pessoas que
contracenaram conosco: a plenitude pela partilha em forma de circulo aberto.
Deveríamos ter uma parte do cérebro que impedisse apagar um olhar, aquele
olhar..., a pequena eternidade que possibilita a continuidade da vida e seus
recomeços.
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La Paloma, Uruguay - Fotografia de Pedro Costa |
[Retorno ao blog em 2014. Seguirei escrevendo aos jornais
e divulgando essas publicações também pelo facebook.]
Um novo ano mais leve, com muita paz e saúde.
Se conseguirmos dois 'sim' para cada 'não', já estaremos no lucro nessa matemática-desafio que é a própria existência. Pois, que assim seja.
Agradeço a todos pela companhia que me fez e faz crescer muito.
Abraço do tamanho dos Pampas!
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No litoral do Rio Grande do Sul. |