![]() |
Fotografia de Ana Cecília Romeu |
Às vezes tudo se ilumina de uma intensa irrealidade
E é como se agora este pobre, este único, este efêmero instante do mundo
Estivesse pintado numa tela,
Sempre...
(Mário Quintana)
Uma viagem insólita está prestes a acontecer.
Grande aventura no melhor estilo surreal, mas de roteiro que não parte de um
filme de ficção científica com naves interplanetárias à velocidade da luz. Essa
viagem tem início no estacionamento, na garagem, na rua, em qualquer cenário
urbano onde esteja o nosso veículo, e começa ao darmos a partida no motor,
quando imaginar a próxima cena é uma coisa impossível.
Capacidade
mediúnica é o que precisaríamos no trânsito brasileiro. Nunca se sabe o que
o motorista do carro da frente fará, visto que poucos usam a sinalização; e
mensurar as ações do sujeito que dirige o carro detrás, visto que poucos usam
os freios.
No trajeto que percorro todos os dias, recordo do grande ídolo Senna e
que ele foi, sim, o maior. Muito disso, provavelmente, se deveu a ter dirigido
nas ruas e enfrentado o trânsito caótico e sinistro que temos. Tudo, exatamente
tudo, parece se atravessar na nossa frente num piscar de olhos ou sem mesmo
piscá-los.
Sempre
ouço CD no carro para suavizar um pouco a situação e outro dia escutando Bendita la luz de tu mirada, do grupo
Maná, bem na hora em que eles cantam: "Bendito Diós por encontrarlo en el
camino", se atravessa em pleno voo, não sei de onde..., um pneu inteiro,
repetindo, um pneu inteiro; não apenas a calota. Por sorte, muita sorte e
milésimos de segundos, o tal pneu voador encontrou um terreno baldio. Tipo de
situação que a gente chora e sorri ao mesmo tempo e que meteria pavor até mesmo
nos terríveis personagens hollywoodianos como o Jason, do clássico Sexta-feira
13.
O
GPS deveria vir com consulta on-line de um clarividente, com sinal sonoro de
"piii" prenunciando mensagens do tipo: "Altere seu trajeto, não
pegue a RS 118, porque voará um pneu bem na frente do seu carro.”
Vê-se
de tudo, desde o sujeito que quer vencer a “corrida” a todo custo: para ele não
existe sinal vermelho e sequer outros carros na pista. E ainda os desatentos,
os despreparados, os brigões: uma reprodução do nosso universo social em
amostras sobre rodas.
O
trânsito nos impõe sermos Sennas, mas eu não passo de mais uma motorista que precisa se deslocar de um lado a outro. E quando ligo o carro, meu sagrado ritual: agradeço
pela vida. Quando retorno a casa e o desligo em definitivo, agradeço pela
vida duas vezes. Isso, todo santo dia.
*Crônica publicada nos jornais:
NH (Novo Hamburgo),
Diário Popular (Pelotas),
Diário de Cachoeirinha/Sinos,
Correio de Gravataí/Sinos,
site do Correio Rural.
site do Correio Rural.
Pateta no trânsito - Walt Disney